a arte de adam neate
dimensionalist painter
Antes de falar da arte de Adam Neate, é preciso deixar claro que eu não sou crítico de arte. Na verdade, até considero que tenho uma certa carência de conhecimentos que limitam o meu entendimento no universo das artes plásticas. Tem muita coisa que não entendo mesmo em certas “instalações” ou na chamada “arte moderna”. Acho que não estou sozinho nessa, o que não deixa de ser um consolo.
Por outro lado, isso significa que quando um determinado trabalho consegue prender os meus olhos é porque ele ignorou toda essa a barreira da falta de conhecimento e me levou ao estado que só a arte consegue: o estado da emoção que faz refletir. Foi isso que aconteceu quando fui ver o trabalho do artista inglês Adam Neate na abertura da sua exposição “Dimensional Editions” na Elms Lesters, no Soho. Ele é um dos nomes de uma consagrada geração de artistas de rua ingleses.
A história da minha ida ao evento começou há mais de um mês atrás quando encontrei Waleska Nomura, no LATA Street Festival. Waleska é casada com Adam e foi, se não me falha a memória, a primeira artista brasileira que mostramos aqui no Canal Londres, ainda em 2009. Foi nessa época que ouvi falar de Adam Neate pela primeira vez. Mas ficou por aí.
Quando cheguei à galeria e vi os primeiros trabalhos, ainda a uma certa distância, lembro que a primeira impressão que tive foi a de que me depararia com um trabalho bonito, mas de cunho decorativo. O que seria decepcionante. À medida em que me aproximei dos trabalhos, essa impressão evaporou por completo. Quando mais via os quadros, mais eu me surpreendia e admirava o que estava diante dos olhos. E, como dizia o pensador espanhol Miguel de Unamuno, “admirar é aprender”.
O trabalho de Adam Neate é bonito, cheio de cores fortes, mas quando a gente olha com um pouco mais de atenção vai percebendo os elementos que conduzem à reflexão. Há solidão nas expressões dos seus personagens. Em certos trabalhos, existe uma certa reminiscência da infância, quando a gente brinca com as possibilidade tridimensionais do papel, dobrando e recortando para criar figuras e objetos. Outro elemento que me chamou a atenção foram os registros do cotidiano: um homem que parece em meio ao caos ao tentar passar uma roupa, um senhor dirigindo um carrinho de cortar grama, a mesa de bar e o copo como companheiros, a solidão da varanda.
Adam Neate vem da Street Art e ele consegue levar para a galeria os elementos do cotidiano que a arte de rua coloca nas paredes dos grandes centros urbanos. A grande diferença é que a gente percebe uma elaboração no trabalho que não é possível quando se pinta na rua. Não é um trabalho meramente intuitivo, há, por trás de cada um deles, estudo e técnica. Mas é uma técnica à serviço do artista, como instrumento e não com fim. Isso faz com que o que se vê na parede vá muito além da beleza decorativa.
Eu lembro que, em 1994, eu vi o trabalho do genial Francisco de Goya, pessoalmente, pela primeira vez, numa visita que fiz ao Museu del Prado, em Madri. Nunca esqueci da minha reação, do nó na garganta. Era tudo sombrio, escuro, desesperador. A imagem de “Saturn devouring his son”. Não consegui ver mais nada no museu. Quis ir embora. É uma obra grandiosa, mas que eu não conseguira ver diariamente.
Não estou querendo estabelecer nenhuma comparação, óbvio, Goia é um artista testado pelo tempo, mas consegui ver um paralelo. Enquanto o trabalho de Goia me levou ao desespero, à vontade de sair dali e não voltar, os quadros de Adam Neate me conduziram à reflexão profunda mas leva. Ele consegue extrair beleza da tristeza, da solidão, do desespero. E isso me prendeu. Um trabalho que eu gostaria de poder levar comigo ao sair da galeria. De certa forma, foi o que fiz.